Pincelada #4 – Quando a falta de continuidade nas narrativas se transforma num erro grotesco

Num certo dia, eu encontrei a maior das heresias que um escritor pode cometer num livro: não se preocupar com a continuidade da sua história.

O erro observado foi grotesco. A autora, de nacionalidade norte-americana, famosa por fazer com que os seus leitores derramem rios de lágrimas, termina um capítulo com a sua personagem a marcar um almoço com a mãe que se realizará no dia seguinte. Todavia, no dia seguinte, a personagem começa o novo capítulo, inexplicavelmente, a almoçar com as amigas. Como é que isso pode acontecer de uma forma totalmente abrupta e sem sentido? Sem desmarcar o almoço com a mãe por telefone, mensagem ou e-mail? Mencionar, através de um recado, para sua mãe, em cima da mesa, a ocorrência de um imprevisto?

Voltei atrás algumas páginas, reli o capítulo do início e comprovei que não era o sono que estava a atrapalhar a minha leitura; ele ainda estava lá, o pecado da falta de continuidade!

A maneira mais fácil de não frustrar o seu leitor com esse tipo de erro é muito simples: basta ler o que escreveu, ontem, para dar continuidade à sua história, hoje. Não existe nenhum mistério, trata-se de uma questão de atenção, somente.

Quero relatar uma outra situação que me incomoda, ainda que seja de forma ligeira, nos livros onde as histórias se durante um extenso período temporal: Avançar no tempo sem grandes explicações. A título de exemplo, saltar do verão para o inverno sem mencionar, pelo menos, a passagem do outono. Frases curtas e autoexplicativas resolvem o problema:

“Os dias passavam com a mesma velocidade com que eu os riscava no meu calendário.”

Aproveito a oportunidade, já que estamos a falar de calendários: verificar as datas do seu livro é a dica para ultrapassar mais um tipo de pecado mortal. Passo a explicar: estou a escrever um livro, no qual a história é baseada num diário de 1997 e se passa em Los Angeles. Tendo isso em conta, precisei de pesquisar, não só, o calendário do ano citado, como também todas as datas escolares, feriados, férias, dias da semana, etc. Naturalmente, um trabalho inenarrável de madrugadas empenhada em tabelas multicoloridas para garantir que as minhas adolescentes não tivessem uma prova importante marcada em pleno Dia de Ação de Graças.

Eu suma, dá trabalho, mas vale a pena, portanto, seja um escritor atento e não corra o risco de ser mandado para o inferno pelo seu leitor.

Foto: Kyle Gregory Devaras/Unsplash

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Boas leituras!

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