#6 – Literatura, Tradução e Etnocentrismo

Neste novo texto, Anna Beatriz Freitas faz-nos refletir numa questão bastante pertinente: Por vezes, mesmo que seja uma decisão tomada, de forma inconsciente, enquanto leitores acabamos por ler mais autores ingleses, americanos, franceses, entre outras nacionalidades, na sua maioria de raça branca, em deterimento de autores brancos, de países como, por exemplo, a Coreia do Sul, a Argentina, a Colômbia ou, ainda, autores negros, de países como a Nigéria, que possui autoras como Chimamanda Ngozi Adichie, Buchi Emecheta, Oyinkan Braithwaite e Tomi Adeyemi, o Gana, país de Yaa Giasi, a Jamaica, que nos deu Marlon James, e o Ruanda, que viu nascer Gaël Faye. Sabe por que é que isto acontece e afecta, sem qualquer dúvida, também o trabalho do tradutor?

Já parou para se perguntar o porquê de já ter lido tantos livros de autores europeus e norte-americanos, mas quase não ter tido contacto com obras africanas, por exemplo? Já se perguntou por que é tão fácil encontrar literatura inglesa, nas livrarias, mas nem sempre é fácil achar o tal livro daquele autor colombiano que te recomendaram? Estamos tão condicionados a consumir o conteúdo que vem do “centro”, das “potências”, que nem sequer temos a curiosidade de procurar por outras opções. Quando procuramos, nos deparamos com um mundo de conhecimento e diversidade enriquecedor, mas, também, com uma realidade muito triste.

O etnocentrismo consiste, basicamente, em ver o mundo com base na sua própria cultura, julgando-se superior aos demais em termos culturais, religiosos e étnico-raciais. A história do mundo é marcada por essa visão, que atinge tanto aqueles que a praticam, quanto os que sofrem com o etnocentrismo. As nossas relações foram fundadas nessa visão inadequada e seria impossível que isso não atingisse o campo da literatura e da tradução.

A história da tradução é marcada pelo etnocentrismo, um bom exemplo são as “Belas Infiéis”, dr França, que consistiam num processo de domesticação de obras estrangeiras, ou seja, traduziam obras oriundas de culturas que consideravam inferiores de acordo com o que a França julgava melhor, transformando aquela obra estrangeira numa “obra francesa”.

Hoje em dia, podemos ver claramente o efeito do etnocentrismo quantos milhares de obras norte-americanas e europeias são traduzidas e vendidas em todos os países, anualmente. Contudo, quando pesquisamos as vendas de obras consideradas “periféricas”, elas não chegam nem a um terço desse número.  Essas obras não são escassas, nem inferiores, apenas não recebem a devida importância no campo literário e no campo da tradução.

Certamente você já leu algo de Victor Hugo, mas já ouviu falar de Alain Mabanckou?  Sabe. muito provavelmente, quem é Markus Zusak, mas sabe quem é Buchi Emecheta ou Han Kang? Se são todos autores maravilhosos e importantes, então, porque é que não temos acesso às suas obras, de forma semelhante? Isso deve-se, sobretudo, ao etnocentrismo, que engloba questões como a religião, a raça e o género.

De facto, a culpa não é sua, o sistema é que funciona assim, e isso já é antigo. ainda que lutemos para que essa realidade mude. Ainda assim, é importante dizer que continuar a limitar-se ao que o sistema nos oferece é uma escolha. Eu sugiro que abra os seus horizontes para ter novas experiências, procure além daquilo que acha que pode ser sufiente para si! De repente, há um mundo de descobertas pronto pra te surpreender, e te arrebatar, bem na sua frente, basta querer ver.

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Boas leituras!

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