“Sono”, de Haruki Murakami

Um título curto para uma narrativa curta, que eu considero como um conto. No entanto, se já leu Haruki Murakami, sabe que este consagrado autor do país dos Samurais e do Sol Nascente, cria histórias espetaculares, muitas vezes, de coisas banais e rotineiras. Na minha opinião, \”Sono\”, apesar de nos remeter para um ambiente calmo e de relaxamento, acredito que Murakami queira chamar-nos à atenção para a sensação de adormecimento em que nos envolver quando somos engolidos pela rotina de todos os dias.Li através da edição portuguesa, editada pela casa das Letras, com 96 páginas, ilustrações da ilustradora alemã Kat Menschik e tradução de Maria João Lourenço. No Brasil, saiu pela Editora Alfaguara.

\”Há dezassete dias que não durmo.\” — Haruki Murakami

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Fonte: Casa das Letras

Desde pequenos, sempre ouvimos dizer que dormir faz bem, que ajuda a ter a mente fresca para o dia seguinte, que recarrega as nossas energias, que a falta de dormir provoca problemas na nossa saúde. No entanto, a protagonista deste conto, que não tem o nome revelado em nenhum ponto da narrativa, muito provavelmente, porque o sono é algo comum a todos os humanos, confessa ao leitor, logo na primeira linha, a sua dificuldade em dormir, o que nos deixa com vontade de saber o motivo que está por detrás deste problema.

Já imaginou como se sentiria se não dormisse um único minuto durante 17 dias? Qual seria o impacto que isso teria no seu dia-a-dia e na sua rotina familiar? Em que zona sombria e tenebrosa se iria encontrar?

Narrado em 1ª pessoa, a protagonista conta-nos que, num certo dia, teve um pesadelo, que ela absorveu como real, para ela, era realidade. Foi, a partir daí que ela deixou de conseguir dormir. Na sua opinião, as suas insónias já tinham ultrapassarado todos os limites. Ao longo da história, ela revela como era a sua rotina antes de ter esse acontecimento que mudou a sua vida, ainda que todas as pessoas ao seu redor não tenham notado essa mudança.

Aos poucos, ela vai retomando uma das suas paixões, a leitura. Ficamos a saber que ela, quando era mais nova, gostava de ler compulsivamente. Por esse motivo, não é de estranhar que, por ter ter mais 5 a 8 horas livres, para fazer o que lhe apetece, ela releia alguns dos seus livros favoritos, entre eles, o clássico de Tolstói, \”Anna Karénina\” e Dostoiévski.

\”O melhor era pegar num livro para ver se me vinha a vontade de dormir. Fui ao quarto e tirei um livro da estante. O meu marido nem sequer se mexeu quando eu acendi a luz. A minha escolha recaiu sobre Anna Karénina. Estava com vontade de ler um longo romance russo.\” — Haruki Murakami

Para além da temática do sono, ela aborda o tema das relações familiares e a rotina que a engolia por completo, chegando a ver as tarefas de casa, nomeadamente, fazer a comida para o marido, fazer as compras, cozinhar, brincar com o filho e, diria mesmo, o ato de ter relações sexuais com o seu companheiro como uma espécie de dever:

\”Fazer as compras, cozinhar, brincar com o meu filho – passaram a ser tarefas que eu desempenhava por obrigação. Até mesmo manter relações sexuais com o meu marido era para mim um dever.\” — Haruki Murakami

É importante realçar que se, por um lado, nos primeiros dias, ela até gostava da sensação de permanecer acordada, durante horas a fio, por outro, com o passar do tempo, ela começou a questionar tudo ao seu redor, visto que, de certa forma, a rotina e as noites em que ela conseguia dormir, no passado, \”escondiam\” as imperfeições da sua vida e da sua família. Algo que mudou radicalmente desde que ela deixou de precisar de dormir, uma vez que começou a levantar dúvidas sobre se a sua vida seria tão perfeita como ela achava que era, refletiu sobre a sua própria existência, sobre os seus hábitos e, indo mais longe, sobre o que é a morte.

Outra das coisas que gostei foram as referências que o autor faz a compositores de música clássica e o final aberto que o conto tem, o que nos permite fazer várias interpretações e, além disso, existem coisas que não têm que ser explicadas ou terem respostas fechadas,

Por fim, é uma leitura que eu indico, até como uma das obras que podem servir de onto de partida, para quem nunca leu nada escrito por Murakami e, aos poucos, quer começar a conhecer a sua escrita. 

Foto: Haruki Murakami por Petr Josek

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Sobre o autor:
Nascido em Quioto, no Japão, em Janeiro de 1949, Haruki Murakami cresceu em Kobe e licenciou-se na Universidade Waseda, em Tóquio. Durante quatro anos, viveu nos Estados Unidos, onde deu aulas em Princeton. Contudo, acabou por regressar ao seu país em 1995. É considerado um dos autores mais importantes da atual literatura japonesa. A sua obra está traduzida para mais de quarenta idiomas e recebeu importantes prêmios, como o Yomiuri — que já foi concedido a autores como Yukio Mishima, Kenzaburo Oe e Kobo Abe — e o Franz Kafka Prize. Actualmente, o escritor vive nas proximidades de Tóquio. Entre as obras mais conhecidas figuram “Norwegian Wood”, “Crónica do Pássaro de Corda”, “Sputnik, Meu Amor”, “Sono”, “Ouve a Canção do Vento & Flíper, 1973”, “Kafka à Beira-Mar”, “O Elefante Evapora-se” e, sem dúvida, a trilogia “1Q84”. É constantemente indicado como um potencial vencedor do Nobel de Literatura. Todas as obras mencionadas foram editadas, em terras lusas pela Casa das Letras.

Sugestão de Leitura:

Leitores residentes em Portugal:
“Sono”, de Haruki Murakami (Casa das Letras, Wook):
https://www.wook.pt/livro/sono-haruki-murakami/15249251

Leitores residentes no Brasil:
“Sono”, de Haruki Murakami (Editora Alfaguara, Livraria da Travessa):
https://www.travessa.com.br/sono-1-ed-2015/artigo/7126a77f-d8e1-4091-8ea4-c2ae9e4bf9d9

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Boas leituras!

1 thought on ““Sono”, de Haruki Murakami”

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