Com a inauguração da Livraria da Travessa, Lisboa acolhe mais um pedacinho do espírito literário brasileiro

A ideia surgiu, na passagem de ano de 2017 para 2018, na cabeça do empresário Rui Gomes Araújo, o fundador da Casa Pau-Brasil, no Princípe Real. Este espaço que já alberga muitas das suas grandes marcas, acaba de receber a mais conhecida rede de livrarias das terras de Vera Cruz. A livraria ocupa o piso térreo do edifício e estende-se por 300m2 e promete ser um ponto de encontro entre o leitor e o livro.

Oriundo de Belo Horizonte, em Minas Gerais, a sua carreira de livreiro começou depois de se ter mudado para a cidade maravilhosa. Nessa época, a ditadura e a censura ainda estavam muito presentes no país do samba. Em declarações ao Diário de Notícias, Rui Campos recordou a fase em que trabalhou numa pequena livraria que ambicionava adquirir e vender livros escritos por autores portugueses. Contudo, não deixou de referir, naturalmente, as dificuldades que enfrentou, aquando da recepção dos livros enviados pelos editores portugueses após várias cartas trocadas. No entanto, como já seria de esperar, devido ao ambiente que existia do outro lado do Atlântico, a maioria dos autores ou dos temas abordados nos livros eram censurados e apreendidos na alfândega. Porém, o seu espírito persistente não o deixou desistir.

Onze anos mais tarde, em 1986, com o encerramento da Livraria Muro, localizada em Ipanema, tomou a decisão de se fixar no centro da cidade, na Travessa do Ouvidor, se quiserem que seja mais preciso, e dessa forma, iniciou esta sua aventura com a abertura da primeira Livraria da Travessa.

Surpreendentemente, apesar de diversas livrarias estarem a fechar, esta importante cadeia de livrarias está em sentido inverso. Com 8 livrarias em solo brasileiro, acabou de inaugurar o seu primeiro ponto de venda de livros no velho continente.

Inserida num espaço de 300m2, a Livraria da Travessa Lisboa ocupa o piso térreo da Casa Pau Brasil, um edifício que, desde a sua fundação em 2017, alberga algumas das maiores marcas de origem canarinha.

Mas como é que tudo começou? Quem é que teve a ideia trazer a livraria para Portugal? Bem, foi o empresário Rui Gomes Araújo, durante a passagem do ano de 2017 e 2018, ainda que, num primeiro momento, o fundador disse que “não, que não seria possível”. Todavia, com o passar do tempo, o ritmo constante das conversas manteve-se e o objectivo tornou-se concreto no domingo passado. Em vez de termos cadeirões e tapetes, como antes, agora, temos paredes e compridas estantes repletas de livros.

No dia da inauguração, pelas 11:30, foram lançados dois livros infantis, “Conta Comigo e Não Tenhas Medo”, da autoria de Marta Coelho e Ana Rita Malveiro, editados pela Máquina de Voar. À tarde, pelas 17 horas, o escritor brasileiro Eucanaã Ferraz apresentou “Retratos com Erro”, o seu mais recente livro editado em Portugal pela Tinta da China. A apresentação esteve a cargo de Pedro Mexia e Rosa Maria Martelo. Além disso, o público presente pôde escutar a cantora Adriana Calcanhotto a ler alguns dos poemas. Sem qualquer margem para dúvida, estes foram, somente, os primeiros eventos que o livreiro vai querer receber na sua mais recente livraria.

Mesmo sem ter raízes familiares em Portugal, Campos traça um paralelismo entre os portugueses e os brasileiros que nasceram em Minas Gerais. Diz mesmo que “nós, os mineiros, somos muito parecidos com os portugueses, temos a mesma densidade, a melancolia, a saudade”.
Como se isso não suficientemente interessante, garante que não é por ter vindo a Lisboa que elege “Os Maias”, de Eça de Queirós como a sua obra literária favorita e, entre sorrisos, diz que a obra-prima do autor português já possui esse estatuto desde há muito tempo.

Com uma parceria estabelecida, desde 2013, com a Flip – Festa Literária Internacional de Paraty um dos maiores eventos literários brasileiros que, anualmente, arrasta milhares de leitores e amantes dos livros até àquela pacata cidade do Rio de Janeiro, depois de Lisboa, segue-se a abertura de mais uma livraria em São Paulo, ainda que, desta vez, seja uma abertura marcante e histórica na sua trajectória, pelo facto de atingir uma dezena de livrarias.

Na sua visão, o aumento da produção de ebooks não é uma ameaça aos livros em formato físico, muito pelo contrário. Num mundo em que as pessoas capturadas, literalmente, pelos múltiplos ecrãs. Através deles, elas trabalham, para conversar, ou seja, por outras palavras, para tudo. Por estas e muitas outras razões, os livros em papel podem ser um escape para escapar a este mundo cada vez mais tecnológico. Um antídoto que as faça baixar a velocidade e tirar o melhor partido de cada dia.

Muitos devem estar a perguntar quais são os ingredientes que fazem da Livraria da Travessa, um caso de sucesso. A filosofia da cadeia brasileira combina 3 pilares que, para eles, são vitais.

O primeiro é, de forma clara e evidente, a curadoria: a escolha dos livros que serão vendidos é criteriosa e os responsáveis realizam uma interpretação do momento cultural e do contexto que os rodeia.

O segundo prende-se com o ambiente que envolve a livraria, desde a arquitectura, passando pelo design e pelas estantes, sem esquecer o papel da iluminação. Nestes espaços tudo é pensado ao pormenor e coordenado por Bel Lobo, arquiteta e sócia da Travessa.

Por último, mas não menos importante, a formação constante dos livreiros, que entregam a sua alma à livraria, leva-os a um atendimento personalizado de qualidade e excelência.

“Prometemos ser um espaço de encontro do leitor com o livro. Como toda a coisa cultural, o gosto pelo livro tem de ser cultivado. Não é uma questão de sobrevivência, não morremos por não ler um livro. Mas é uma questão de qualidade de vida, a vida é melhor se lermos. Queremos que seja um lugar agradável, que as pessoas entrem, mesmo que não queiram comprar nada e, quem sabe, fiquem com vontade de levar um livro ou mais.\” — Rui Campos, fundador da Livraria da Travessa

Em termos de oferta, os leitores e os apaixonados pelas letras vão ter, ao seu dispor, aproximadamente, 60% dos livros publicados por aqui, aos quais se juntam 20% dos livros vindos do Brasil e, ainda, 20% dos livros vindos de outros países, o que, na verdade, faz com que não esconda a sua frustração, uma vez que considera que a legislação em vigor está desajustada da realidade actual. Sobretudo, porque qualquer pessoa pode encomendar, na internet. livros publicados pelas editoras canarinhas, mas ele, devido aos direitos de autor, sendo livreiro, não os pode vender ao público na livraria. Apesar disso, garante que vão ter todos os autores brasileiros que conseguirem.

A livraria de Lisboa vai empregar dez pessoas e será gerida pela portuguesa Ana Reis-Sá, numa estreita colaboração com a brasileira Fernanda Teodoro, e em sintonia com a coordenação-geral da Travessa no Brasil. Pode visitar a Livraria da Travessa de Lisboa, na Rua da Escola Politécnica, 46, no Princípe Real, todos os dias, de segunda a sábado das 10.00 às 22.00 e ao domingo das 11.00 às 20.00.

Foto: Livraria da Travessa de Lisboa/Divulgação

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Boas leituras!

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