A civilização grega é, sempre, uma daquelas civilizações que mais desperta o interesse dos amantes de História. Como me considero um amante desta matéria, desde criança, é bom ver que a Quetzal Editores vai lançar uma nova edição de “Odisseia”, o poema colossal de Homero, com uma nova tradução e notas de Frederico Lourenço, a 25 de Fevereiro.
Verdadeiro amante de “Ilíada”, de Homero, o escritor e tradutor português Frederico Lourenço que, actualmente, está a traduzir o 4º volume, duma coleção de 6 volumes, da Bíblia grega para o português, cujo lançamento está previsto para o mês de Novembro, lança, a 25 de Fevereiro, uma nova tradução de “Odisseia” pela Quetzal Editores.
Quando leu, pela primeira, vez este magistral poema, o tradutor era, ainda, uma criança. Curiosamente, Homero foi o tema da sua primeira aula, depois da sua licenciatura. Assim sendo, surgem duas questões: Será que Homero persegue Frederico Lourenço? Ou será que a paixão deste classicista pelo grego, é definitivamente, imensurável?
Nesta nova edição, a sua anterior tradução, também, a partir do idioma de Sófocles, das épicas aventuras de Odisseu (Ulisses, para os latinos), publicada pela Cotovia, em 2003, foi revista linha a linha, cumprindo, desta forma, o desafio que lhe foi endereçado pela editora.
Adicionalmente, posso revelar que as quase 700 páginas desta edição de capa dura, contêm notas que vão, inegavelmente, ajudar a perceber a grandeza daquilo que o público está a ler.
Há 3 dias atrás, durante a apresentação da obra aos jornalistas que aconteceu na Cinemateca Portuguesa, o especialista sublinhou:
“Voltarei sempre a Homero com todo o gosto. É um texto que não me cansa. Quanto mais se lê, mais parece inesgotável e fascinante”.
Nas suas próprias palavras, esta edição difere muito da anterior e a principal diferença reside na tradução. Se voltarmos atrás no tempo, mais precisamente, 15 anos, a sua intenção era dar a conhecer o poema ao público português, visto que, na sua opinião, ainda não era conhecido de forma aceitável. Uma das razões é que até à chegada da sua tradução às livrarias lusas, só havia uma versão disponível na língua de Camões. Contudo, essa edição era em prosa e foi traduzida desde o francês, tal como acontecia com “Ilíada”, traduzida, igualmente, pelo autor, primeiramente, em 2005.
Ainda durante a apresentação, Frederico Lourenço salienta: “Muitas pessoas, em Portugal, não sabiam o que era a Odisseia.”. No entanto,, explica: “No Brasil, a situação era diferente”. Todavia, as edições brasileiras sempre estiveram mais preocupadas em tentar encontrar uma “linguagem muito rebuscada” que fosse de encontro à linguagem utilizada por Homero, do que em fazer uma tradução exacta do grego original.
Lourenço evidencia a sua opção, no que toca à tradução: “Aqui optei mais pelo rigor do que pelo som”, reconhecendo que, na edição de 2003, nalgumas partes, não tinha tido isso tanto em mente. “Esta está mais fiel ao que está em grego” correspondendo “de forma mais rigorosa” à versão universalmente aceite da Odisseia. E que grego é este? É uma língua “que ninguém falou”. “A Bíblia foi escrita num grego que as pessoas falavam e que, na altura, era mais ou menos internacional”, afirmou o tradutor.
Na sua tentativa de responder á questão anterior, o autor esclarece:
“No caso da Odisseia, é uma mistura de dialetos. Era como se fosse uma mistura de catalão, castelhano e galego. A um grego da altura, daria a sensação de que se tratava da sua própria língua mas, ao mesmo tempo, não era. É uma língua totalmente artificial, poética, literária, mas ao mesmo tempo é grego, que é o grego da Bíblia”.
Surpreendentemente, enquanto o autor continua traduzir a Bíblia grega, aproximadamente, 90% das palavras que podem ser encontradas nela, provêm da literatura antecedente. Algumas delas aparecem, inclusivé, em “Odisseia”.
O classicista demonstra que tem uma genuína paixão pelo grego e acredita até que tem uma missão: “Sinto que a minha missão é dizer às pessoas o quão importante é o ensino do grego. É horrível perceber que, um dia, em Portugal, não vai haver ninguém a saber grego.”
Ainda assim, existem outra questão que vão muito além desta, o que nos pode levar a um tema que, para mim, rossa uma excessiva procura da perfeição, por porte de nós, os humanos. Segundo o tradutor, algumas das edições anteriores procuraram incessantemente, privilegiar uma prosa repleta de uma ilusória e irrepreensível perfeição, dado que é isso que se espera de uma obra-prima. Mas, ao contrário do que se possa pensar, essa perfeição não está presente nesta obra.
Em toda a sua extensão, o poema está cheio de pequenas inconsistências que, geralmente, são oriundas da própria tradição oral que, muito provavelmente, passam ao lado dos mais distraídos. “Essas coisas estão tão bem disfarçadas que uma pessoa pode ler o poema” sem se dar conta delas, adiantou Lourenço. Seguramente, foi isso que o fez colocar as notas explicativas que acompanham esta edição, no final de cada canto do poema, em vez de estarem nas respectivas páginas.
Só assim, é possível manter a experiência “de deslumbramento” e até de ingenuidade que alguns leitores quererão ter, preservando a ideia de que a Odisseia pode ser lida como um poema deslumbrante, mas também de forma crítica”. “Esta é uma edição que dará essa dupla oportunidade.”