Neste meu novo texto de opinião venho falar – vos do livro \”O Outono do Patriarca\”, de Gabriel García Márquez, lançado em 1975. Este foi o primeiro romance escrito pelo autor após o sucesso de \”Cem Anos de solidão\” e descreve – nos a velhice de um governante déspota e autoritário, algures nas margens do mar das Caraíbas.
Apesar da história se passar num país fictício, percebemos claramente que se trata de uma forte crítica às ditaduras da América Latina do século XX. Esta criação de um cenário imaginário fez-me lembrar bastante a mítica cidade de Macondo, presente na narrativa que nos traz a saga dos Buendía. Em relação à escrita, esta obra é muito diferente de tudo o que já li até agora, uma vez que é composta por longos parágrafos onde intervêem vários personagens distintos.
\”E ali o vimos a ele, com o uniforme de cotim sem insígnias, as polainas, a espora de ouro no calcanhar esquerdo, mais velho do que todos os homens e do que todos os homens da terra e da água, e estava caído no chão, de barriga para baixo, com o braço direito por debaixo da cabeça, para que lhe servisse de almofada, como tinha dormido noite após noite durante todas as noites da sua longuíssima vida de déspota solitário. Só quando o viramos para ver – lhe a cara compreendemos que era impossível reconhecê – lo, mesmo que não estivesse carcomido de auras, porque nenhum de nos o tinha visto nunca.\” — Gabriel García Márquez
Confesso que, inicialmente, a forma como o autor usa e abusa do discurso indireto livre causou-me alguma confusão. No entanto, rendi-me rapidamente ao ritmo impresso à narrativa. Achei este livro muito esclarecedor em relação à dinâmica de uma ditadura sobre vários pontos de vista, começando pelo ponto de vista do patriarca déspota, solitário e decadente, que não sabe como chegou ao poder nem o que fazer com ele. Na realidade, a este ditador interessa, somente, o seu bem estar doa a quem doer, morra quem morrer.
O abismo entre a ilusão do poder e a realidade do povo é tão grande que, por vezes, aquelas gentes têm dificuldade em acreditar se aquele governante existe mesmo. Esta obra crítica, também, os gastos excessivos destes governos enquanto a população vive rodeada pela miséria e pela opressão. Um dos retratos mais pertinentes é o do diretor dos serviços secretos que constrói uma verdadeira máquina de opressão e terror onde o governante, velho e caquético, não passa de um peão.
Em suma, gostei muito deste livro e aconselho-o como uma leitura diferente e desconcertante de Gabriel García Márquez.
Foto: Gabriel García Márquez por Santi Burgos
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Sobre o autor:
Nasceu em Aracataca, na Colômbia, a 6 de março de 1927. Foi um escritor, jornalista, editor, ativista e político colombiano. Considerado um dos autores mais importantes do século XX, foi um dos escritores mais admirados e traduzidos no mundo, com mais de 40 milhões de livros vendidos em 36 idiomas. Foi laureado com o Prémio Internacional Neustadt de Literatura em 1972, e o Nobel de Literatura de 1982 pelo conjunto de sua obra que, entre outros livros, inclui o aclamado Cem Anos de Solidão. Foi o maior representante do que ficou conhecido como realismo mágico na literatura latino-americana. Viajou muito pela Europa e viveu no México, até falecer a 17 de abril de 2014, aos 87 anos.
Sugestões de Leitura:
Leitores residentes em Portugal:
“O Outono do Patriarca”, de Gabriel García Márquez (Dom Quixote, Wook):
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Boas leituras!