Maria dos Firmina dos Reis será a primeira autora negra a ser homenageada na Flip

Finalmente, depois de duas dezenas de edições, chegou a hora de homenagear, pela primeira vez, uma autora negra. Maria Firmina dos Reis, autora maranhense que ficou conhecida pelo seu romance “Úrsula”, foi a figura escolhida.

O anúncio foi realizado pelo trio de curadores deste ano, Fernanda Bastos, Milena Brito e Pedro Meira Monteiro, ao lado do diretor artístico da Flip, Mauro Munhoz, na manhã de ontem.

Foi uma autora esquecida no cânone que hoje é pesquisada principalmente por mulheres”, referiu Bastos, apontando que o gancho da edição deste ano é “ver o invisível”.

A Flip ainda é uma instância de consagração, por isso queremos sugerir um outro século 1, uma outra Independência.
— Meira Monteiro

Nascida na Ilha de São Luís, no Maranhão, a 11 de março
de 1825, Maria Firmina dos Reis foi registrada como filha de João Pedro Esteves e Leonor Felipe dos Reis e era prima do escritor maranhense Francisco Sotero dos Reis, por parte da mãe. Em 1830, mudou-se com a família para a vila de São José de Guimarães. Viveu parte de sua vida, na casa de uma tia materna, melhor situada economicamente. Em 1847, concorreu à cadeira de Instrução Primária, nessa localidade, e, depois de ter sido aprovada, exerceu a profissão, ali mesmo, como professora de primeiras letras, de 1847 a 1881. Negra e bastarda, enfrentou a barreira dos preconceitos e publicou, em 1859, o romance “Úrsula”, considerado o primeiro romance abolicionista do Brasil e um dos primeiros escritos produzidos por uma mulher brasileira.

\"\"
\”Úrsula\”, de Maria Firmina dos Reis
(ed. Penguin-Companhia, 224 páginas)

Com o seu romance “Úrsula”, originalmente publicado no ano de 1859, Reis derrubou barreiras na literatura feminina e abolicionista — as marcas que ela deixou na cultura brasileira serão esquadrinhadas pela crítica literária Fernanda Miranda e pela historiadora Ana Flávia Magalhães Pinto na mesa que abre a Flip na quarta-feira, 23 de novembro.

Em relação à obra, categorizada por muitos como a sua obra-prima, ela coloca, no centro do seu enredo, triângulos amorosos tangenciados por pessoas escravizadas —uma humanização pouco comum na época — e é catalisada pelo movimento abolicionista de então.

Até ao momento, aquela que será a 20ª edição da Flip, tem uma programação mais centrada no lado feminino. Para confirmar isso, estão confirmadas 25 mulheres e 9 homens no que diz respeito à programação deste ano.

A curadoria do mais prestigioso festival literário do país, que acontecerá até ao domingo seguinte, também detalhou os convidados que vão compor a programação deste ano — incluindo o maior nome divulgado até agora, o da francesa Annie Ernaux, uma das principais referências da literatura contemporânea mundial.

Popularizada no país por três livros que a Fósforo Editora lançou desde que abriu as portas — “O Lugar”, “Os Anos” e “O Acontecimento”—, a célebre escritora de 82 anos participará numa conversa no sábado ao lado da brasileira Veronica Stigger. Não poderia deixar de sublinhar que, até ao final deste ano, mais dois títulos de Ernaux chegarão às livrarias brasileiras pela mesma casa editorial.

Outras presenças internacionais de destaque incluem a antropóloga francesa Nastassja Martin, autora do cultuado “Escute as Feras”, que integra o catálogo da Editora 34; o chileno Benjamín Labatut, do inclassificável “Quando Deixamos de Entender o Mundo”, publicado pela Editora Todavia; e a cubana Teresa Cárdenas, voz central da literatura negra latino-americana, que publica pelas independentes Pallas e Figura de Linguagem.

O foco na diversidade geográfica, somado às dificuldades de captação de recursos pelo estrangulamento da Lei Rouanet, culmina em uma edição com menor presença internacional. Até agora são dez autores estrangeiros confirmados, contra 13 das duas edições presenciais anteriores, em 2018 e 2019.

Também é uma festa mais enxuta como um todo, por enquanto, com apenas 17 mesas confirmadas ante uma regra geral de cerca de 20 encontros na programação principal —vale manter em mente que mais mesas ainda podem ser divulgadas nos próximos meses.

O ingresso para cada mesa da Flip também encareceu, alcançando até R$ 120. Na última edição presencial, há três anos, era preciso desembolsar R$ 55 para entrar.

Foto: Maria Firmina dos Reis por João Gabriel dos Santos Araújo

Sugestões de Leitura:

Leitores residentes no Brasil:
“Úrsula”, de Maria Firmina dos Reis (Companhia das Letras, Amazon Brasil):
https://www.amazon.com.br/%C3%9Arsula-Maria-Firmina-dos-Reis/dp/8582850816
**“A Vergonha”, de Annie Ernaux (Editora Fósforo, Amazon Brasil):
https://www.amazon.com.br/Vergonha-Annie-Ernaux/dp/6584568504
** Obs: Livro em pré-venda. Envio a partir de 20.09.2022
“O Acontecimento”, de Annie Ernaux (Editora Fósforo, Amazon Brasil):
https://www.amazon.com.br/ACONTECIMENTO-ANNIE-ERNAUX/dp/6589733554
“Os Anos”, de Annie Ernaux (Editora Fósforo, Amazon Brasil):
https://www.amazon.com.br/Os-anos-Annie-Ernaux/dp/6589733147
“O Lugar”, de Annie Ernaux (Editora Fósforo, Amazon Brasil):
https://www.amazon.com.br/Lugar-Annie-Ernaux/dp/6589733023
*Escute as Feras*, de Nastassja Martin (Editora 34, Amazon Brasil):
https://www.amazon.com.br/Escute-as-feras-Nastassja-Martin/dp/6555250828
“Quando deixamos de entender o mundo”, de Benjamin Labatut (Editora Todavia, Amazon Brasil):
https://www.amazon.com.br/Quando-deixamos-entender-Benjam%C3%ADn-Labatut/dp/6556922498

Boas leituras!

Leave a Comment

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Scroll to Top