#9 – A língua como espelho da sociedade

Neste texto, que marca o regresso de Anna Beatriz Freitas, ela faz-nos refletir sobre a importância dos exercício de reflexão que um tradutor tem de fazer quando está a traduzir uma obra e, nesse processo árduo e demorado, também se inclui o estudo aprofundado de uma determinada socidade. Afinal a língua acaba por representar muito mais que uma forma de comunicação entre as pessoas, na medida em que tanbém representa tradições. modos de pensar, de viver a vida dessas pessoas, entre muitas outras coisas.

É incrível quando paramos para pensar em como a língua está conectada com as relações sociais. Na verdade, muitas vezes, nem damos conta do quanto a nossa língua pode espelhar o nosso estilo de vida. Como já dito anteriormente, a tradução passa por um processo árduo de pesquisa, por um exercício de reflexão continuo, não apenas sobre a língua, mas também sobre a sociedade.

Vamos pensar na seguinte situação: um tradutor, já com alguns anos de carreira no âmbito do português e do francês, decide que vai trabalhar, também, com o japonês. Para estar apto a fazê-lo, além de se aprofundar nos estudos da língua, ele terá igualmente de entender mais sobre a cultura japonesa, pois já sabemos que não é possível estudar a língua sem estudar a cultura da mesma.  Será que ele sentirá uma diferença muito grande se comparar com o âmbito português- francês? Afinal, se está tudo relacionado no processo tradutório, porque é que seria diferente?

De facto, está tudo relacionado no processo tradutório, mas devemos levar em consideração a questão de que cada língua é um universo. A questão não é que uma é mais complexa que a outra, é só que existem línguas que se aproximam e outras que se distanciam em medidas diferentes. Ou seja, querendo ou não, o português e o francês estão mais próximos um do outro do que o japonês. Logo, o nosso tradutor sentirá uma grande diferença.

Um bom exemplo é a questão do tratamento entre pessoas de hierarquias diferentes. É claro que o nosso tradutor conhece a cadeia hierárquica e as particularidades linguísticas que existem dentro dessa questão. No entanto, ao migrar para o âmbito cultural japonês, ele verá que isso é ainda mais rígido do que ele estava acostumado. Digamos que o nosso tradutor queira traduzir um livro que fale sobre a vida de dois irmãos. No âmbito português-francês, ele encontrará alguns percalços, mas no âmbito da língua japonesa, além de tudo, ele terá que tomar muito cuidado com o vocabulário, pois ele se diferencia em função de quem é o irmão mais velho e quem é o mais novo, por exemplo.

Sim, no Japão há uma hierarquia até nas relações fraternas. Se aqui podemos chamar o nosso irmão pelo nome, não importando se ele é mais velho ou mais novo do que nós, lá no Japão, isso importa muito. O irmão mais velho pode se dirigir ao mais novo pelo nome, ou por “você”, mas, ao irmão mais novo, isso não é permitido. Por isso, ele deve usar o termo “irmão mais velho”, se quiser se dirigir ao seu irmão. É uma questão cultural que está intimamente relacionada com a língua, e o nosso tradutor deve estar atento a tais questões, pois disso vai depender o resultado do seu trabalho.

Existem diversas outras particularidades que poderiam ser citadas dentro desse exemplo, mas o que vale ressaltar é que a tradução envolve processos muito mais complexos do que imaginamos. Ela é um exercício continuo de pesquisa e renovação, pois o seu objeto de trabalho – a língua – está vivo, logo, está em constante transformação. O português de há cinquenta anos atrás não é o mesmo que o de hoje. A sociedade japonesa não é como a francesa, italiana, russa, brasileira, mas elas podem se conectar, conversar e se conhecer através de um processo tradutório consciente e respeitoso.

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Boas leituras!

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